O Requiem Português: Matuttino de Morti de David Perez

Segunda, 1 de Novembro de 2021 - 21:00
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O Requiem Português: Matuttino de Morti de David Perez
MS. Viseu em estreia moderna para 5 solistas

 

"Fui aos Mártires para ouvir as famosas matinas de Perez. A música, majestosa e comovedora, para além de toda a descrição, a esplêndida decoração da igreja fora substituída por paramentos de luto, o coro forrado de preto, os altares velados, o altar-mor coberto de panejamentos púrpura e ouro, e no meio do coro catafalso rodeado de castiçais e altas velas. […] Primeiro um silêncio tremendo e depois o solene ofício dos finados. Os músicos até empalidecem quando cantam Timor mortis, etc. […] Eu tremia todo e pouco faltou para chorar. […] Tão majestosa e comovedora música foi coisa que nunca ouvi e que talvez nunca mais ouça, porque a chama do entusiasmo religioso está a apagar-se em quase toda a Europa e ameaça extinguir-se totalmente dentro de poucos anos. Como ainda arde em Lisboa, consegue produzir, em nossos dias, a mais impressionante expressão musical. Todas as figuras da orquestra parecem compenetradas do espírito daquelas terríveis palavras que Perez e Jommelli musicaram com uma tão tremenda sublimidade. Não só a música, até o sério porte dos executantes e dos sacerdotes que ofciavam, bem como, na verdade, de toda a congregação, era de molde a transmitir um solene e religioso do mundo além-campa. […]"

 


Este expressivo testemunho da época relativo à data de 26 de Novembro de 1787 é da autoria do viajante inglês William Beckford, e reporta-se a uma das circunstâncias em que esta obra na sua versão com orquestra foi executada no contexto das cerimónias da Irmandade de Santa Cecília de Lisboa. O texto traduz de um modo extremamente vivo a experiência e o contexto de execução, pleno de rituais e de teatralidade, em que as grandes celebrações religiosas da capital portuguesa se encontravam mergulhadas.

O Matuttino de’morti foi composto por David Perez (Nápoles, 1711-Lisboa, 1778) e estreado no dia 25 de Maio de 1770 na Igreja do Santuário de Nossa Senhora do Cabo - Espichel, por ocasião de Sua Alteza o Príncipe da Beira ter assumido o Primicério da Irmandade de Santa Cecília. David Perez, considerado na época como um dos expoentes da música dramática na Europa, tem nesta obra a sua mais celebrada peça de música religiosa, que veio a ser executada anualmente no dia de Santa Cecília para celebrar a memória dos músicos da irmandade falecidos.

Desta obra, encontrou, o director musical dos agrupamentos Capella Joanina & Flores de Mvsica, uma versão mais compacta e com algumas secções completamente novas no manuscrito que se guarda no Arquivo Eclesiástico da Sé de Viseu. Os meios vocais são idênticos à versão de 1770, dois sopranos, um alto, um tenor e dois baixos, mas o instrumentária é diverso. Para além dos andamentos serem menos extensos, a diferença mais notória entre as duas versões é o facto da versão do manuscrito de Viseu alinhar com uma prática que existiu em Portugal de sobrevalorização de instrumentos graves em peças alusivas a contextos fúnebres. Assim, as partes de orquestra são transcritas para um grupo instrumental reduzido de dois fagotes, um violoncelo, contrabaixo e órgão, resultando em texturas sonoras mais escuras e, neste sentido, mais misteriosas e dramáticas. Os andamentos sucedem-se, como pequenos microcosmos vocais extremamente depurados; uma das mais belas obras de música religiosa de finais do século dezoito.
 

CAPELLA JOANINA & FLORES DE MVSICA

Capucine Keller, Anne Magouet, sopranos
Nélia Gonçalves, alto
Gerson Coelho, tenor
Renaud Delaigue, Tiago Mota, baixos
Hugues Kesteman, Joana Almeida, fagotes
Fernando Santiago, violoncelo
Jean-Marc Faucher, contrabaixo
João Janeiro, órgão e direcção